Três copos disciplinadamente colocados um ao lado do outro.
Um limão meio mordido e sal que queimava ainda os lábios partidos. Levantou o
dedo. Outra dose. O barman riu e ela
sorriu de volta, meio de lado, tímida, o efeito da bebida ainda não tinha
chegado aos lábios, o cérebro parecia anuviar-se enquanto o coração estava a
ponto de ser partir. Outra dose sim. E mais outra, era tudo que precisava. E a
coleção de copos aumentava na sua frente.
A perna escorregava do banco alto, deixando entrever um pouco das coxas
brancas. Mais uma, mais uma. E o coração bateu forte e o riso veio solto, e o
cabelo se jogou sem sentir. E olhos se encontraram sem se ver. A máscara caía
ou era colocada, ali ninguém nunca iria saber.
O moço chegou próximo, sorriso aberto, o dela também surgiu fácil,
mostrando a falha no dente que odiava. Batom firme ainda na boca. Ele lhe
falava qualquer coisa na orelha que ela interpretava como versos de dos Anjos.
A mão na cintura, a mão na perna, acariciando o tecido do vestido e tudo ela deixava,
deixava, deixava. Na sua frente um
poeta, enquanto as luzes piscavam incessantes. Seria bonito? Qual a cor dos
olhos? Onde estava o sorriso? Então piscavam, a música mudava e era lindo,
pintura saída da renascença, era um príncipe, um anjo ou um demônio? E ela ria
alto, falava alto, e durante dois segundos se sentiu sozinha e então segurou a
vontade de chorar alto apoiando-se em ombros desconhecidos. Como se chamava?
Era Rogério? Marcos? Marcelo, certeza que era Marcelo. Então sorria,sorria,
sorria, enquanto tudo piscava e mudava, enquanto fugia do foco e da própria
alma. Dançava e sorria e sorria. Tudo por fora, o vômito consequente do medo já
queimando na garganta e sorria, sorria. Não era a hora, era quem ali se não
ela? Era outra. Sem medo. Sem amargo.
Sem dor. Só ria e ria e ria enquanto murchava na boca o riso forçado, enquanto
quem era ele mesmo pergunta se ela estava bem. Claro que estava. Olho o
sorriso, não olhe nos olhos, sorria. E pediu mais uma dose, e outra, e outra.
Empilhando os copos, quebrando copos,
machucando um pouco mais de si. Então sorriu. Sorria. E sorria e sorria.
