sexta-feira, maio 9

Tempestade em copo d'água fria.

- Há um tornado vindo aí.

Havia riso na voz de Joe, o pavor estava concentrado todo dentro dos olhos amarelados pela doença. Olhava para o céu como se o dito tornado fosse se formar em cima da sua cabeça.

Mary não conseguia mais olhar o céu. Da última vez que olhara estava roxo e lívido de fúria. As grandes e gordas nuvens cor de chumbo agitavam-se numa dança mortal que parecia não querer deixar sobreviventes.  Fazia cinco minutos que ela havia tapado os olhos azuis com as mãos sujas de terra enquanto o vento assobiava em seus ouvidos, uivando a dor que a terra sentiria.

- Hey, pequena, levanta! Abre esses olhinhos abre, a gente precisa sair daqui. Abre.

As mãos de Joe seguravam as suas próprias, mãos ásperas e grandes que primeiro foram suaves e depois mostraram sua força. Ele a machucava enquanto os dois lutavam na escuridão dos olhos dela, fechados, cerrados, medrosos. Ele havia conseguido lhe tirar as mãos do rosto, mas não a faria enxergar.

- Levanta, menina, levanta. E olha pra mim, olha pra mim, Mary! Não olha o céu, olha pra mim.

Ele a sacudia enquanto falava, as mãos se apertando em volta dos braços finos e criando marcas que demorariam a sair. Mary sentia as lágrimas quentes começarem a descer pelo rosto, foi quando Joe a abraçou com a mesma força que a balançava e de repente a dor era menor que o sofrimento.

- Olha pra mim, Mary, olha pra mim por favor. A gente precisa sair daqui, entende? Precisa.

Então ela olhou e no lugar do céu perturbador havia apenas o rosto velho e cansado de Joe. Haviam as rugas e barba acinzentada, a cicatriz que cortava a sobrancelha esquerda e a boca fina. E havia os olhos amarelos pela doença tão cheios de lágrimas quanto os seus pequeninos azuis.

Levantaram-se os dois do lamaçal que se transformava o jardim dos fundos do casebre velho. Levantaram e correram contra o vento, contra a morte. E contra o medo.


Nenhum comentário:

Postar um comentário