sexta-feira, maio 9

O sol ardia sobre a pele nua das crianças que corriam soltando gritos de felicidade em direção ao mar.
Era um agosto sufocante em que o ar demorava demais pra chegar aos pulmões e entrava ardendo pelas narinas machucadas pela seca. Mas eles eram só crianças, não se lembravam que quando a noite chegasse iam chorar enquanto as mães gritariam lembrando de terem falado pra não pegar o sol do meio dia enquanto espalhavam loção na pele machucada e vermelha. Não lembravam que a haveria noite, que existia momento depois dali, do mar, do gosto de sal e do sol acima deles.

-A gente vai entrar mas até onde der pé, tá? E se vir uma onda muito grande a gente segura um no outro! – Camila falava rindo enquanto as espumas acariciavam suas pernas magras e os dedos se perdiam dentro da areia.
-Tá! Você já disse, vem logo!

Ele já havia ido na frente, a água batendo na cintura e deixando-o mais alto a cada onda. E continuou indo enquanto ela gritava e ria por trás dele e indo até quando não sentiu mais o chão.

...

- Juntos?
- Juntos.
- No três?
- Aham. – ele riu, ela também e uma covinha se formou na bochecha. Havia algo de nervoso na respiração descompassada dele e nas rugas que se formavam na testa dela.
- E se der problema?
- Deu.
Riram de novo.
- No Três? – ele assentiu com a cabeça e ela riu de novo.
- Vai. Um, dois...
E ele já tinha virado o copo.

...

- Lembra da época em que a gente não precisava de remédio?
-Lembra da época em que você não precisava de antidepressivo?
- Ansiolíticos, reguladores de humor.
-Terapia!
-Micro-fisioterapia.
-Yoga!
-Meditação.
- Viagem astral...
-Lembra da época em que a viagem era outra?
Ele apertou ainda mais a mão na dela, entrelaçando os dedos e dividindo um pouco mais da vida, os dois olhando para o céu contemplando o brilho de estrelas mortas.
- Era melhor, não era?
- Era.
Os olhos se encontraram.
- E era pior também.
As bocas se encontraram.
- Era. Bem pior.
- Eu olho pra você e vejo um pouquinho de mim.
- Eu também.
- Você é um cara bacana, sabia?
Ele riu o riso mais sério que ela já tinha escutado.
-Você não sabe do que tá falando, você não me conhece.
Os olhos se encontraram.
- Eu olho pra você e me sinto em casa. Eu olho pra você e é bom. Olho e não tenho ressaca, não preocupo minha mãe...
Silêncio.
- É bom.
- Me dá um abraço?
- Dou até três.

As almas se encontraram.

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